Análise de Acórdão: Processo nº
1336/17.7BELSB, secção: CA-2º JUÍZO, 24-05-2018
Enquadramento geral:
Breve
apresentação do acórdão
A
ação em causa foi proposta no Tribunal Central administrativo do Sul, que é um
dos tribunais existentes na rede de tribunais administrativos nacional.
Na ação temos como parte uma
sociedade comercial, que impugnou a decisão proferida pela Câmara Municipal de
Lisboa. Tal decisão tinha sido proferida no âmbito de um processo de
contraordenação, que condenou a sociedade ao pagamento 51 euros a título de custas
e 600 euros referentes à prática de uma contraordenação punida no 21º/1 a) do
DL nº 309/2012 de 16 de Dezembro. Esta decisão da CML veio revogar o Despacho de
Aplicação de Medidas Cautelares anteriormente aplicada à sociedade (que adveio de
uma reclamação de ruído por violação do RGR- Regulamento Geral do Ruído), tal
medida cautelar tinha como objetivo que a sociedade, no prazo de 30 dias, iniciasse o procedimento competente para obter a licença que lhe era necessária
para a prática da sua atividade. Em causa está a falta de uma licença camarária
que permitiria à sociedade a realização de espetáculos com música ao vivo,
sendo que a falta de licença consubstancia uma ilegalidade (tipificada em
diploma que regulamente a instalação e funcionamento de recintos de
espetáculos). O representante do estabelecimento agiu assim com falta de cuidado e
com consciência da ilicitude da sua conduta.
O
tribunal a quo deu provimento à impugnação da sociedade e consequentemente revogou
a decisão da contraordenação, absolvendo a sociedade do respetivo
pagamento. O MP recorreu de tal decisão para o presente tribunal pedindo que a
decisão do tribunal a quo seja esta fosse revogada e substituída por uma outra que julgue
improcedente o recurso de impugnação.
A
principal questão neste acórdão, para a análise em presença, passa pelo
despacho de 20.04.2018 em que foi oficiosamente suscitada pelo relator (Pedro
Marchão Marques) a exceção de incompetência em razão da matéria dos tribunais
administrativos para julgar a causa (esta questão é de conhecimento oficioso
tal como refere o 89º/4 a) CPTA). Em causa está análise do 4º/1 l) ETAF com a
redação dada pela reforma, através do DL nº 214-G/2015, que refere que cabe à
jurisdição administrativa conhecer: “impugnações judiciais de decisões da
Administração Pública que apliquem coimas no âmbito do ilícito de mera
ordenação social por violação de normas de direito administrativo em matéria de
urbanismo e do ilícito de mera ordenação social por violação de normas
tributárias”. O tribunal em causa refere que mesmo que esta contraordenação,
sobretudo na vertente referente ao ruído, apesar da sua irrelevância material para
a contraordenação em presença, tenha conexão com matéria de “ambiente” e com a
eventual afetação de direitos de personalidade, continua sem se poder
considerar que a matéria é referente ao urbanismo e que nessa medida não se encaixa
no 4º/1 l) ETAF.
A
conclusão deste tribunal seria que caberia aos tribunais judiciais julgar a
causa em presença (212º CRP e 40º/1 da LOSJ), sendo ainda que tomar em conta o
61º/1 RGCO que refere: “É competente para conhecer do recurso o tribunal em
cuja área territorial se tiver consumado a infração”. Em suma, o tribunal
administrativo em causa não se considera competente e como tal obsta ao
conhecimento do mérito do recurso interposto, devendo assim o processo ser remetido
para o tribunal competente, o qual anulará os atos que não se teriam praticado
se perante ele tivesse corrido o processo e ordenará a repetição dos atos
necessários para conhecer da causa. De acordo com o 130º/4 b) LOSJ, a
competência para apreciar recursos de contraordenação até 15 mil euros está
deferida ao Juízo de Pequena Criminalidade.
Breve
contextualização
Cabe
primeiramente fazer uma introdução da questão em causa. Para que um tribunal
administrativo possa julgar a causa é necessário verificar se os pressupostos
processuais estão preenchidos, desde logo, os pressupostos referentes ao
tribunal, sendo que estes se podem dividir em quatro planos:
1) Competência
em razão da jurisdição: que é a que interessa apreciar, em causa está o
esclarecimento da questão de saber se a ação deve ser proposta na jurisdição
administrativa e tributária ou antes perante os tribunais judiciais;
2) Competência
em razão da matéria;
3) Competência
em razão da hierarquia;
4) Competência
em razão do território.
Cumpre
ainda destacar que a reforma de 2015 trouxe várias alterações ao âmbito da
jurisdição administrativa apesar de continuar sem mudar o seu paradigma, desde
logo mantendo o critério operativo do 212º/3 CRP (relações jurídico-administrativas).
Esta reforma trouxe ainda duas mudanças, sendo elas a clarificação e um
alargamento da jurisdição administrativa. Tal alargamento pretendia abranger várias
matérias, das quais:
1) Condenação à remoção de situações constituídas em “via de facto”.
2) Fixação da justa indemnização devida por expropriações, servidões e outras restrições de utilidade pública;
3) Impugnação de decisões da Administração Pública que apliquem coimas, no âmbito do ilícito de mera ordenação social, por violação de normas de direito administrativo em matéria de ambiente, ordenamento do território, urbanismo, património cultural e bens do Estado;
4) Execução da satisfação de obrigações ou respeito por limitações decorrentes de atos administrativos que não possam ser impostos coercivamente pela Administração.
1) Condenação à remoção de situações constituídas em “via de facto”.
2) Fixação da justa indemnização devida por expropriações, servidões e outras restrições de utilidade pública;
3) Impugnação de decisões da Administração Pública que apliquem coimas, no âmbito do ilícito de mera ordenação social, por violação de normas de direito administrativo em matéria de ambiente, ordenamento do território, urbanismo, património cultural e bens do Estado;
4) Execução da satisfação de obrigações ou respeito por limitações decorrentes de atos administrativos que não possam ser impostos coercivamente pela Administração.
O
que cabe referir é que a inclusão de todas estas matérias já poderia ser feita
através do critério do 212º/3 CRP, sendo que este projeto de alargamento é
apenas uma sua densificação. Mas tem de se frisar que o alargamento não se deu
com todo este âmbito em matéria de impugnação de coimas, sendo que apenas
vigora a matéria referente ao urbanismo. A razão para esta opção legislativa
prendeu-se com a ideia de uma “perspetiva equilibrada, que salvaguarde
ponderosas razões de ordem prática”. Ou seja, os argumentos invocados foram que
não existiam recursos humanos e materiais no aparelho judiciário administrativo
para que, com eficiência, se conseguisse suportar o aumento de processo que o
alargamento geraria; outro argumento passa pelo aumento da já morosa justiça
administrativa e o argumento final remata com uma ausência da formação de juízes
nos tribunais administrativos sobre esta matéria, que fossem capazes de
proporcionar uma garantia da tutela jurisdicional efetiva (tal como refere Diogo
Freitas de Amaral). Remeteu-se para uma futura revisão um alargamento na sua
plenitude em vez de se ter optado por alagar um período da vacatio legis para
se poder restruturar e adequar os meios materiais e humanos de forma a alcançar
tal alargamento.
Argumentos contra a integração
desta contraordenação no âmbito de jurisdição dos tribunais administrativos
O
tribunal em presença invocou vários argumentos a ter em conta, desde logo:
1) Invocou o anteprojeto submetido pelo Governo, em que este contemplava a possibilidade de um alargamento do âmbito de jurisdição a muitos outros domínios (3º/3 m)). Sendo que o que foi consagrado foi apenas o domínio do ilícito de mera ordenação social em matéria urbanística. O legislador deixou de fora a matéria do ambiente e do ordenamento do território, entre outras. O tribunal, argumentou assim, que a interpretação da “matéria do urbanismo” deve ter em conta este contexto, no sentido de se poder dizer, com segurança, que o legislador não pretendeu atribuir aos tribunais administrativos uma competência genérica nesta área das contraordenações.
2) Foi invocado também o argumento sistemático, pois o legislador ao traçar o âmbito de jurisdição administrativa consagrou no 4º/1 k) ETAF várias matérias que depois na alínea seguinte (l)) restringiu. Era assim um objetivo do legislador fazer essa verdadeira restrição.
3) Outro argumento invocado foi que Fernanda Paula Oliveira só admite como contraordenações urbanísticas as do RJUE (98º e 99º), do Regime Jurídico da Reabilitação Urbana e de Regulamentos municipais em matéria urbanística. As contraordenações em matéria urbanística transferidas para a jurisdição administrativa são sem dúvidas as reguladas nesses diplomas. Não sendo a contraordenação em causa regulada por nenhum destes diplomas então conclui-se que este argumento vai no sentido de excluir do âmbito de jurisdição administrativa o recurso em causa.
4) Outro argumento, já supra mencionado, prende-se que mesmo que se considera-se a vertente do ruído, que para o caso parece ser irrelevante para a determinação da infração, ainda assim apenas nos permitiria fazer uma conexão com a matéria do ambiente, mas sendo a contraordenação em causa tipificada no diploma que regulamenta a instalação e funcionamento dos recintos de espetáculo, não estamos perante matéria urbanística.
1) Invocou o anteprojeto submetido pelo Governo, em que este contemplava a possibilidade de um alargamento do âmbito de jurisdição a muitos outros domínios (3º/3 m)). Sendo que o que foi consagrado foi apenas o domínio do ilícito de mera ordenação social em matéria urbanística. O legislador deixou de fora a matéria do ambiente e do ordenamento do território, entre outras. O tribunal, argumentou assim, que a interpretação da “matéria do urbanismo” deve ter em conta este contexto, no sentido de se poder dizer, com segurança, que o legislador não pretendeu atribuir aos tribunais administrativos uma competência genérica nesta área das contraordenações.
2) Foi invocado também o argumento sistemático, pois o legislador ao traçar o âmbito de jurisdição administrativa consagrou no 4º/1 k) ETAF várias matérias que depois na alínea seguinte (l)) restringiu. Era assim um objetivo do legislador fazer essa verdadeira restrição.
3) Outro argumento invocado foi que Fernanda Paula Oliveira só admite como contraordenações urbanísticas as do RJUE (98º e 99º), do Regime Jurídico da Reabilitação Urbana e de Regulamentos municipais em matéria urbanística. As contraordenações em matéria urbanística transferidas para a jurisdição administrativa são sem dúvidas as reguladas nesses diplomas. Não sendo a contraordenação em causa regulada por nenhum destes diplomas então conclui-se que este argumento vai no sentido de excluir do âmbito de jurisdição administrativa o recurso em causa.
4) Outro argumento, já supra mencionado, prende-se que mesmo que se considera-se a vertente do ruído, que para o caso parece ser irrelevante para a determinação da infração, ainda assim apenas nos permitiria fazer uma conexão com a matéria do ambiente, mas sendo a contraordenação em causa tipificada no diploma que regulamenta a instalação e funcionamento dos recintos de espetáculo, não estamos perante matéria urbanística.
Indo
ao encontro do conceito de Direito do Urbanismo: conjunto de normas relativas à
ocupação, uso e transformação do solo, tendo por objeto o território
compreendido na sua globalidade (Fernando Alves Correia); ou apelando ao
conceito mais restrito de Diogo Freitas do Amaral, a conclusão será de que esta
contraordenação em causa parece não ter que ver com matéria de urbanismo.
Um
outro argumento, não invocado por este acórdão, mas que pode ser chamado à
colação, é que o 4º/1 l) deixando de fora outras matérias e referindo-se apenas
à matéria do urbanismo acaba por evidenciar a fuga do legislador ao 212º/3 CRP.
Porém, o Tribunal Constitucional reconheceu que tal preceito da CRP não tem
natureza absoluta e não há qualquer inconstitucionalidade em atribuir aos
tribunais comuns os litígios relativos à impugnação de coimas aplicadas ao
abrigo de normas materialmente administrativas (acórdão nº522/2008). Sérvulo
Correia também parece ir neste sentido.
Para Mário Aroso de Almeida, os preceitos
do 4º ETAF devem ser interpretados de forma restritiva, à luz do critério
operativo da alínea o), referente às relações jurídico- administrativas, de modo
a que se evite uma ampliação da jurisdição não pretendida pelo legislador,
visto que este não desconhecia o critério do 212º/3 CRP, pelo que quando no
artigo 4º ETAF, estabeleceu soluções mais amplas ou mais restritas ele na
verdade pretendeu estabelecer tais soluções. O critério das relações jurídico-
administrativas é apenas subsidiário e residual. Tomando em atenção esta
ideia, parece que o autor em causa no 4º/1 l) ETAF defende que apenas se integra
na jurisdição administrativa matérias de urbanismo, de fora ficariam todas as
restantes (ambiente, ordenamento do território, entre outras). Ou seja, encontra-se assim mais
um argumento para não integrar o recurso no âmbito de jurisdição administrativa.
Outro
argumento que poderá ser invocado, passa pelo acrescento que foi feito ao 4º/1
l) - “e do ilícito de mera ordenação social por violação de normas tributárias”.
Tal acrescento pode dar mais força à defesa de que estamos perante um elenco
fechado e taxativo das matérias que foram escolhidas pelo legislador para
integrarem o âmbito de jurisdição administrativa no 4º/1 l) ETAF. Se há a
necessidade desta acrescento, então é porque anteriormente apenas era da competência
dos tribunais administrativos impugnação de coimas em matéria de urbanismo e
não de outras matérias.
Argumentos a favor da integração
desta contraordenação no âmbito de jurisdição dos tribunais administrativos
Se, eventualmente, se entende-se que a contraordenação em causa tinha alguma
proximidade com a matéria do ordenamento do território caberia nesse caso invocar
a posição de Jorge Pação. Este autor, refere que as normas administrativas do
ordenamento do território são indissociáveis das regras sobre matéria de
urbanismo e é injustificável que haja a restrição operada no 4º/1 l) face às
primeiras. A ligação entre ambas é enorme e torna-se difícil traçar
delimitações. Nessa medida, pode fazer-se uma interpretação do 4º/1 l) no
sentido de adotar um conceito de "urbanismo" suficientemente amplo que possa
abarcar as matérias do ordenamento do território. Desta forma, afasta-se uma
aplicação de um regime incoerente na medida em que: se se considerasse que
estaríamos perante matéria de urbanismo a ação deveria ser proposta nos tribunais
administrativos; se se considerasse que a matéria seria do ordenamento do território
então competência já passaria a ser dos tribunais judiciais.
No
mesmo sentido, a própria doutrina, desde logo António Dantas, tem tratado as contraordenações
do território como verdadeiras contraordenações urbanísticas, tal como Fernanda
Paula Oliveira. Estes autores, tal como Jorge Pação defendem que se deve
abandonar uma interpretação histórica e subjetiva do 4º/1 l) ETAF e deverá
fazer-se uma interpretação teleológica de natureza objetiva, incluindo matéria
do ordenamento do território no conceito de “matéria de urbanismo”.
Tal como já foi referido supra, o legislador acabou por fugir ao
cumprimento do 212º/3 CRP, mas ainda assim se poderia invocar o argumento de
que a finalidade do direito administrativo passa por vigiar, reprimir a violação
de normas jurídico-administrativas e aplicar as necessárias sanções
administrativas, logo pode concluir-se que não há dúvidas de que a aplicação de
coimas e sanções acessórias (seguindo a doutrina de Carla Amado Gomes) nestas
matérias do caso em concreto são objeto do ramo de direito administrativo, na
medida em que há violação de normas administrativas. Podendo a contraordenação
em apreciação inserir-se no âmbito de jurisdição administrativa, desde logo através da aplicação do critério operativo do 4º/1 o), apelando assim à coerência do
sistema. A atividade de aplicação de coimas é materialmente e
procedimentalmente integrante da relação jurídica administrativa, sendo que
também há uma razão de especialidade que favorecem a atribuição de tais
litígios aos tribunais administrativos. Temos assim mais um argumento a ser ponderado.
Mário
Aroso de Almeida, refere que em 1979, quando foi criado o ilícito de mera
ordenação social, a impugnação das decisões referentes à aplicação de coimas
foi reservada aos tribunais judiciais por várias razões. A primeira passa pelo
reduzido número de tribunais e juízes administrativos existentes em Portugal
naquela data. Em segunda, havia uma limitação dos poderes instrutórios de
conhecimento e de pronúncia conferido aos juízes administrativos pelo recurso
de contencioso. Porém, nenhuma destas duas razões tem fundamento atualmente,
pois a justiça administrativa foi sofrendo alterações, sobretudo as de 2004. Pegando
nesta linha de pensamento, poder-se-ia concluir que a razão porque as restantes
matérias do anteprojeto não foram incluídas no artigo 4º/1 l) ETAF já não fazem
sentido atualmente, é obsoleta e nessa medida não se observa razões para não integrar
esta contraordenação no âmbito de jurisdição administrativa.
Há
ainda que invocar várias razões para as contraordenação do 4º/1 l) estarem
integradas no âmbito de jurisdição administrativa (tal como refere Licínio Lopes), desde logo:
1) Razão orgânica: a decisão aplicativa da sanção contraordenacional é sempre uma decisão de um órgão administrativo, é um ato administrativo sancionatório;
2) Razão material: trata-se uma atividade materialmente administrativa;
3) Razão normativa: as normas violadas são normas direta e intencionalmente conformadores da atividade da administração e têm natureza administrativa.
4) Razão procedimental: a aplicação da sanção corre nos termos de um procedimento sancionatório que corre exclusivamente no seio da administração e é instruído exclusivamente por esta;
5) Razão funcional: não são raros os casos em que a atividade em causa é objeto de um controlo prévio pela Administração, através de autorizações, licenças, concessões, tal como é objeto de um controlo à posteriori. Em qualquer dos casos, há uma permanente atividade administrativa de fiscalização.
1) Razão orgânica: a decisão aplicativa da sanção contraordenacional é sempre uma decisão de um órgão administrativo, é um ato administrativo sancionatório;
2) Razão material: trata-se uma atividade materialmente administrativa;
3) Razão normativa: as normas violadas são normas direta e intencionalmente conformadores da atividade da administração e têm natureza administrativa.
4) Razão procedimental: a aplicação da sanção corre nos termos de um procedimento sancionatório que corre exclusivamente no seio da administração e é instruído exclusivamente por esta;
5) Razão funcional: não são raros os casos em que a atividade em causa é objeto de um controlo prévio pela Administração, através de autorizações, licenças, concessões, tal como é objeto de um controlo à posteriori. Em qualquer dos casos, há uma permanente atividade administrativa de fiscalização.
Tomada de posição e Conclusão
Tomando
em consideração todos os argumentos enunciados, cabe referir que a
contraordenação em causa não se insere em matéria de urbanismo, pelo menos de
forma direta e imediata, sendo que nesse aspeto tendo a concordar com o
tribunal administrativo em presença. Por outro lado, há duas formas possíveis
de descordar do tribunal e defender que a contraordenação em causa pertence e
deve ser apreciada pelos tribunais administrativos. Ou se defende que a matéria
vertida na contraordenação tem alguma conexão com a matéria do ordenamento do
território e nessa medida, havendo a tal ligação íntima desta matéria com a matéria
do urbanismo se entende (como Jorge Pação, supra
mencionado) que se deve fazer uma interpretação ampla do conceito de urbanismo
de forma a caber também a matéria de ordenamento de território. Ou então, defende-se que o recurso em mãos
se poderia integrar no âmbito de jurisdição administrativa, desde logo pelo
critério do 4º/1 o) ETAF e 212º/3 CRP, pois o objeto do processo não pode
deixar de ser o ato administrativo sancionatório e para apreciar a sua
legalidade o juiz administrativo surge como juiz especializado. Além do mais, tal como refere Jorge Pação, o alargamento que se deu no âmbito da jurisdição administrativa já era uma densificação do 212º/3 CRP.
Em suma, estamos assim perante uma relação
jurídica administrativa, que pode ser caracterizada pelo facto de atribuir prerrogativas
de autoridade ou imponha deveres, sujeições ou limitações especiais a todos ou
alguns dos intervenientes por razões de interesse público, que parece ter sido
o caso. Adota-se assim o critério dito teleológico e não o estatutário das relações jurídicas administrativas. A matéria em causa poderia ser inserida no âmbito de jurisdição administrativa.
-
ALMEIDA, Mário Aroso, Manual de Processo Administrativo,
3ª edição, Almedina, 2017;
-PAÇÃO,
Jorge, Comentários à revista do ETAF e do
CPTA- Novidades em sede de jurisdição dos tribunais administrativos – em
especial, as três novas alíneas do artigo 4.º, n.º 1 do ETAF, 3º edição.
-
MARTINS, Licínio Lopes, Âmbito da jurisdição administrativa no Estatuto dos
Tribunais Administrativos e Fiscais revisto;
-SILVA,
Vasco Pereira da, O contencioso Administrativo
no Divã da Psicanálise- Ensaio sobre ações no novo processo administrativo,
Almedina, 2º edição, 2013;
-CORREIA,
Fernando Alves, Estudos de Direito do
Urbanismo, Almedina, 1997.
-CORREIA,
Fernando Alves, Manual de Direito do
Urbanismo, vol.I, 4º edição, Almedina, 2008.
Neuza Felizardo Carreira, nº57098. Subturma 10, Turma A