Processo Ac:2468/15.1T8CHV-A.G1.S1
Data Ac: 26-03-2019
Anna Verbytska nº56802


Análise de
facto
No caso sub-judice,
está em causa a propositura de uma ação movida pelo Município de --- (executado), ( um ente público estando em causa
uma autarquia local que pertence à administração autónoma do Estado), que
deduziu oposição quanto ao pagamento de uma certa quantia que foi movida pela Santa Casa da Misericórdia de ---- (instituição
particular de solidariedade), alegou assim em sua defesa que o "Protocolo
de Cooperação " dado à execução não constitui um título de execução, sendo
somente uma promessa de doação, e esta deve ser considerada revogada desde 2013.
A Santa Casa (exequente) contesta, e defende que o protocolo deve ser executado e que o mesmo já foi deliberado no seio da câmara municipal e assembleia municipal sendo que estas já o aprovaram ficando assim na eminência da obrigação de o cumprirem.
Proferida a
sentença o juiz julgou improcedente a ação e, consequentemente, o prosseguimento
da execução. A Santa Casa (exequente) contesta, e defende que o protocolo deve ser executado e que o mesmo já foi deliberado no seio da câmara municipal e assembleia municipal sendo que estas já o aprovaram ficando assim na eminência da obrigação de o cumprirem.
O executado (Município) interpõe recurso no tribunal da relação de --- o qual veio a revogar a decisão impugnada julgando procedente a exceção dilatória de incompetência material, e absolveu o Município.
Recurso para o Supremo Tribunal de Justiça
Inconformada,
a exequente (Santa Casa da Misericórdia
de ---) interpôs recurso de revista em sua defesa apresentou os
seguintes pretensões:
1)Pretende
que lhe seja pago o que é devido;
2)O pedido
assenta no incumprimento de um protocolo / contrato o qual é constituído por obrigações
sinalagmáticas sendo que uma parte cumpriu e a outra não; [i]
3)A relação
jurídica em causa deve ser regulada pelo direito civil e não pelo direito administrativo.
Análise de
direito
O STJ sustentou
que os tribunais administrativos segundo o artigo 1º do ETAF são competentes para
julgar e conhecer os conflitos que digam respeito aos litígios emergentes
das" relações jurídicas administrativas ". Este artigo deve ser um
complementado na leitura quanto ao âmbito de jurisdição dos tribunais
administrativos a par do artigo 212º da CRP. O conceito de relação jurídica
administrativa a que se reportam estes artigos tem um enorme estudo por parte
da doutrina
Para o
professor Freitas do Amaral a " relação jurídico-administrativa é
"aquela que confere poderes de autoridade ou impõe restrições de interesse
público à Administração perante os particulares ou que atribui direitos ou
impõe deveres públicos aos particulares perante a Administração “.
O tribunal
vem dizer que o artigo 1 º e) do ETAF não pode ser interpretado no sentido literal,
uma vez que assim todos os litígios que tivessem por base um contrato privado e
nos quais não existisse participação de entidades públicas mas os quais exigiam
concurso público teriam de ser submetidos à apreciação do TA.[ii]
No caso,
pretende-se saber se será ou não da competência dos tribunais administrativos
julgar o conflito emergente entre o Município e a Santa Casa da Misericórdia. A
matéria em causa é geradora de conflitos entre os tribunais uma vez que pode ou
não ser enquadrada num conjunto de normas do ETAF.Nesta instância conclui-se que a relação jurídica deve ser regulada pelos tribunais administrativos em razão da matéria.
O STJ veio dizer
que o tribunal da relação violou o artigo 211 º/1 e 3 da CRP e o artigo 1º e
4/1 e) do ETAF.
De acordo com o artigo 212 ºda CRP é repartido o poder jurisdicional, mas no seu conjunto constitui um bloco unitário.
Perante
este conflito de jurisdições o artigo 1º do ETAF veio estabelecer a competência
material dos tribunais administrativos de modo exemplificativo. Em oposição, os
tribunais judiciais apresentam uma competência material residual, assim estes
são competentes para os restantes litígios que não são abarcados por outra
ordem jurisdicional. De acordo com o artigo 212 ºda CRP é repartido o poder jurisdicional, mas no seu conjunto constitui um bloco unitário.
É importante ressalvar que não existe hierarquia entre os tribunais judiciais e administrativos, eles estão dispostos de modo horizontal, não existe sobreposição entre eles ou relação hierárquica.
O legislador delimitou a competência dos tribunais administrativos ao utilizar o "critério de relação jurídica administrativa ", o artigo 1º do ETAF engloba situações em que:
- um dos
sujeitos deve ser uma entidade pública ou ser privada e atuar como pública
-os
direitos que emergem devem ser contidas em normas legais de Direito Administrativo.
Com base no
conceito relação administrativa constante do artigo 1º do ETAF vai ser
densificado e interpretado o artigo 4º do ETAF. O artigo 1.º, n.º 1, do ETAF
perde o seu carácter de cláusula geral, ao remeter apenas para os “ litígios
compreendidos pelo âmbito de jurisdição” previsto no artigo 4.º.
Subsunção
ao caso concreto
O tribunal
entendeu que a competência deveria ser deferida aos tribunais administrativos.
Enquadrou a matéria em causa no artigo 4º/1 e) do ETAF uma vez que estava em causa
a execução de um incumprimento de um contrato administrativo, o qual contemplava por um lado um compromisso do Município de atribuir a uma determinada pessoa
coletiva/instituição uma quantia pecuniária como contrapartida de uma
contraprestação que é prestada aos seus munícipes, estaria sujeita a um
procedimento pré-contratual, não é uma relação regida pelo direito privado.
A delimitação da competência dos tribunais administrativos em matéria de contratos,
é concentrada numa única norma, a da alínea e) do n.º 1 do artigo 4.º do ETAF. Numa primeira leitura dá a ideia de que – salvo os contratos celebrados nos termos do regime da contratação pública –, os contratos de direito privado celebrados pelas entidades públicas ficam, fora da jurisdição administrativa.
Em segundo lugar, o legislador retoma, a menção à figura do contrato administrativo. Este é visado em termos amplos pelo Código dos Contratos Públicos.
- Vertente positiva do artigo- concentrar nos tribunais administrativos todas as questões da contratação pública não sendo relevante a qualidade subjetiva das entidades adjudicantes (podendo ser estas pessoas coletivas de direito público ou privado), portanto podem ser todas as entidades enumeradas no artigo 2º/1 do CCP e todas segundo o nº2 que possam ser qualificadas como EA)
- Vertente negativa artigo -exclui os contratos de direito privado da Administração que não sejam celebrados nos termos da legislação sobre contratação pública.
Dito isto,
de iure condendo , não estão abrangidas pela alínea e ) todos os contratos
públicos e privados , mas sim somente aqueles que sejam celebrados ao abrigo do código
dos contratos públicos .
Excluídos
ficam todos os contratos de direito privado celebrados pela administração ainda
que submetidos a um procedimento pré-contratual do CCP. Exceto, se a qualificação
do contrato, seja um contrato administrativo ou submetido a um regime de
direito público e os contratos regulados
por um procedimento de direito público. A delimitação do âmbito do artigo 4º/1 e) deve ser feita em conjugação com a designação "legislação sobre contratação pública ".
Cabe ao contencioso administrativo a execução dos contratos públicos de direito privado e os contratos públicos que sejam administrativos.
O que importa reter é que a apreciação dos pressupostos presentes no artigo 4º/1 e) deve ser feita do ponto de vista a ter em conta o estabelecimento de uma relação jurídica administrativa sendo esta configurada na causa de pedir.
Em suma,
concordo com a decisão do tribunal supremo da justiça em diferir a competência
aos tribunais administrativos, pelos motivos acima mencionados e analisados uma
vez que o contrato celebrado reconduz-se à matéria do artigo 4º/1 e) ETAF enquadrando-se na
sua previsão. O contrato foi celebrado entre o Município que é uma entidade adjudicante nos termos do artigo 2º/1 c) CCP e a Santa Casa da Misericórdia que é uma entidade que cabe no artigo 2/2 a) do CCP podendo ser classificada como uma entidade adjudicante , a qualidade de sujeito público ou privado é irrelevante.
[i]
Excerto do acórdão: “ter este Município se comprometido a atribuir à
Santa Casa da Misericórdia de --- um apoio financeiro de um milhão de Euros,
transferindo semestralmente uma quantia de € 33.333,33, durante o período de 15
anos.
Tal quantia destinar-se-ia a
comparticipar os custos com a construção, aquisição de material, conservação de
espaços, entre outras despesas, apoio à melhoria das condições de vida da
população, através do apoio à família, proteção à infância etc "
[ii]
Tribunal Administrativo
Bibliografia :
-Mário Aroso de Almeida, Manual de processo administrativo, 2016, almedina
- Diogo Freitas do Amaral,Direito Administrativo volume III páginas 439 e 440
-Mário Aroso de Almeida, o novo regime de processo nos tribunais administrativos, 4ª edição,Almedina, Coimbra ,página 57
Bibliografia :
-Mário Aroso de Almeida, Manual de processo administrativo, 2016, almedina
- Diogo Freitas do Amaral,Direito Administrativo volume III páginas 439 e 440
-Mário Aroso de Almeida, o novo regime de processo nos tribunais administrativos, 4ª edição,Almedina, Coimbra ,página 57
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