Wednesday, 18 December 2019

A Extensão dos efeitos da Sentença


EXTENSÃO DOS EFEITOS DA SENTENÇA

O regime da extensão dos efeitos da sentença vem consagrado no nosso Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), no seu art.161º (baseado no art.110º da Lei da jurisdição contencioso-administrativa espanhola de 1998, embora aí com um âmbito material limitado ao contencioso em matéria tributaria e emprego publico, e sob pressupostos não inteiramente coincidentes com os previstos no artigo 161º do CPTA), regime esse que visa responder aos casos em que uma só entidade pública aplica um determinado regime normativo a vários destinatários, levando esses interessados a propor, contra essa entidade, um elevado número de processos, todos com o mesmo objeto, tendo por base a mesma questão material.
Ao observar o artigo 161º podemos entender que os pressupostos materiais deste são[1]:
1) A existência de uma sentença, transitada em julgado, que tenha anulado ou declarado nulo um ato administrativo desfavorável ou reconhecido a titularidade de uma situação jurídica favorável a uma ou várias pessoas (1ª parte do nº 1);
2) Uma ou várias pessoas sejam destinatárias de ato administrativo com idêntico conteúdo ou se encontrem colocadas na mesma situação jurídica (2ª parte do nº1 e corpo do nº2);
3) Não exista sentença transitada em julgado, se o requerente da extensão dos efeitos tiver recorrido à via judicial (parte final do nº1);
4) (i) Tenham sido proferidas, por tribunais superiores, no mesmo sentido, cinco sentenças transitadas em julgado ou, (ii) No caso de processos em massa, terem sido proferidas três sentenças transitadas em julgado, nos processos selecionados segundo o artigo 48.o (alínea a) do nº2);
5) (i) não ter sido proferido número superior de sentenças, transitadas em julgado, em sentido contrário ao das sentenças referidas na alínea anterior, (ii) nem serem as referidas sentenças contrárias a doutrina assente pelo STA em recurso para uniformização de jurisprudência (alínea b) do nº2).

Por sua vez constituem pressupostos processuais:

6) A apresentação pelo interessado, no prazo de um ano, contado da data em que a sentença foi proferida, de requerimento dirigido à entidade pública, demandada nesse processo - requerimento dirigido ao órgão administrativo competente que o constitua no dever legal de decidir (nº3);
7) Sendo indeferida a pretensão pela entidade pública ou decorridos três meses sem decisão, a apresentação, no prazo de dois meses, no tribunal administrativo que proferiu a sentença, de requerimento a requerer a extensão dos efeitos da sentença e a sua execução a seu favor (nº4);
8) No caso de um interessado que não tenha tomado parte no processo em que a sentença foi proferida, a extensão dos respetivos efeitos só pode ser requerida se esse mesmo tiver lançado mão, no momento próprio, da via judicial adequada, encontrando-se pendente o correspondente processo (nº5)
9) É permitido o pedido de extensão de efeitos nos casos em que, tendo ocorrido a impugnação de um ato administrativo, o interessado tenha sido confrontado, na pendência do processo impugnatório, com o facto de o ato ter sido anulado por sentença proferida noutro processo que, de igual forma, também corria contra o mesmo ato.
Ora, este mecanismo de extensão das sentenças a casos similares consubstancia vários propósitos: como o descongestionamento dos tribunais administrativos, de evitar a massificação processual, promover a igualdade de tratamento entre situações iguais e, por último, proceder à garantia de uma resposta mais célere para a resolução das questões que oponham os particulares à administração pública.[2] Isto acontece na medida em que, sem este regime, todos os afetados pela atuação administrativa lesiva ficariam forçados a recorrer de imediato.
Em primeiro lugar, os particulares dispõem do prazo de um ano a contar da sentença, para solicitarem a extensão à Administração. Quando estiver em causa uma recusa dessa pretensão pela Administração, não dando satisfação à pretensão do interessado, será́ requerida ao tribunal administrativo que proferiu a sentença a tutela judicial da sua pretensão (no prazo de dois meses), mediante a extensão dos efeitos de anterior sentença. Trata-se, por isso, de um regime de direito administrativo substantivo que encontra a sua tutela jurisdicional nos tribunais administrativos. [3]
As diretrizes do artigo 161º não se consubstanciam no processo executivo, ainda que este artigo esteja nele incluído no CPTA, ao invés, trata-se de um instituto de natureza mista, na medida em que numa primeira fase através de um processo administrativo, e numa segunda, caso ocorra a referida recusa por parte da entidade administrativa competente, por via de um processo judicial célere, ao qual se aplicam as regras de execução  das sentenças de anulação de ato administrativo, e a eficácia subjetiva destas relevam sobremaneira para a compreensão da pretensão de extensão dos efeitos da sentença, nos termos do artigo 161º do CPTA, pois através deste regime se permite que terceiros que não foram partes na ação, possam beneficiar dos seus efeitos.
Todavia, segundo a professora Ana Celeste Carvalho, este instrumento contrasta com a reduzida aplicação do regime legal previsto no artigo 161º do CPTA, por falta do seu impulso por parte dos interessados, que quase não têm utilizado esta figura, sendo quantitativamente pouco expressivas nos tribunais administrativos as decisões de extensão dos efeitos de sentenças.
Temos também de ter em conta que, à semelhança do que é referido por Luís Filipe Colaço Antunes, numa ótica de alcançar uma maior congruência, no mecanismo de extensão das sentenças, o objeto do processo administrativo deve englobar, não só a pretensão do autor, mas também o ato impugnado e os seus vícios. Isto deve suceder na medida em que o interesse lesado pelo ato ilegal é também parte do objeto do processo administrativo. Ora, na falta deste passo, acabaria por ocorrer um fracionamento entre as ações para o reconhecimento de direitos e interesses legalmente protegidos e os meios impugnatórios, em consequência da díspar natureza dos pressupostos processuais. Só desta forma, a jurisprudência, sem incoerência, pode compatibilizar, o efeito erga omnes da sentença anulatória com a extensão ultra partes dos direitos ou situações jurídicas a terceiros que a decisão judicial tenha reconhecido a favor dos autores.
Em suma, tal como já foi defendido ao longo deste texto, o regime da extensão dos efeitos das sentenças do artigo 161º é de avultada importância para o processo administrativo, na medida em que procura alcançar um tratamento substancialmente idêntico para situações idênticas, mesmo com a intrínseca consequência de um sacrifício da relativa estabilidade dos atos administrativos cujo prazo de impugnação já decorreu. A somar a isto, podemos considerar que os instrumentos consubstanciados neste artigo, são um fomento para que seja possível alcançar um meio de redução de custos seja à Administração, seja aos particulares, conferindo maior eficiência e celeridade procedimental. Citando o Professor José Vieira de Andrade "o objetivo será o de conseguir uma igualdade de tratamento em "casos perfeitamente idênticos", tratando estes atos como se constituíssem um único ato plural(...)".


Bibliografia:
ü Almeida, Mário Aroso de: "Manual de Processo Administrativo", Almedina, 2013
ü Ana Celeste Carvalho, A extensão dos efeitos da sentença no processo administrativo Revisto, in E-Pública, Número 7, 2016;
ü Andrade, José Vieira de: "A Justiça Administrativa", 10º Edição, Almedina, 2015;
ü Antunes, Luís Filipe Colaço: "O artigo 161º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos: uma complexa simplificação", Cadernos de Justiça Administrativa nº 43;
ü Moura, Marta Veiga e, “A análise ao nº1 do artigo 161º do CPTA”, Tese de Mestrado, Faculdade de Direito, Universidade de Lisboa, 2015;
ü Oliveira, Rodrigo Esteves de: "Processo Executivo: algumas questões";
ü Silveira, João Tiago, A extensão dos efeitos de sentenças a casos idênticos no contencioso administrativo, in Estudos em Homenagem a Miguel Galvão Teles Volume I, Almedina, 2012;

David Rito Mendes 
N.º 28526
4º ANO 
Turma A
Subturma 10
Contencioso Administrativo e tributário 



[1] Ana Celeste Carvalho, “A Extensão Dos Efeitos Da Sentença No Processo Administrativo Revisto” in e-pública, abril 2016
[2] Silveira, João Tiago, A extensão dos efeitos de sentenças a casos idênticos no contencioso administrativo, in Estudos em Homenagem a Miguel Galvão Teles Volume I
[3] Ana Celeste Carvalho, A extensão dos efeitos da sentença no processo administrativo Revisto, in E-Pública, número 7, 2016

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